17 de agosto de 2013

O PLANO ASTRAL



Na extensa literatura sobre Teosofia, este pequeno livro se destaca por certas características especialmente marcadas. É uma tentativa para descrever a Mundo Invisível da mesma maneira que um botânico descreveria algum novo território neste globo, não explorado por qualquer botânico anterior.

A maioria dos livros que tratam de Misticismo e Ocultismo se caracteriza pela falta de uma apresentação científica, tal qual se faz em todo departamento científico. Mais nos dão a significação das coisas do que descrições das coisas em si. Neste pequeno livro o autor aborda o Mundo Invisível do ponto de vista da ciência.

Como tenho certa ligação com este livro, por ter sido o amanuense que o copiou para a impressão, posso descrever como veio a ser escrito. Na época em que foi escrito, em 1894, C. W. Leadbeater era o secretário da Loja de Londres da Sociedade Teosófica, e o seu presidente era o Sr. A. P. Sinnett. A Loja não fazia propaganda pública nem realizava reuniões abertas; porém três ou quatro vezes por ano se efetuava uma reunião na residência do Sr. Sinnett, e cartões de convite eram enviados aos membros da Loja e aos poucos das "classes superiores" que o Sr. Sinnett julgava provavelmente interessados em Teosofia. O Sr. Sinnett desejava que o Sr, Leadbeater (como era então o seu tratamento) fizesse uma palestra na Loja.

Nosso autor escolheu como tema "O Plano Astral". Cabe citar aqui a descrição que ele próprio fez do seu treinamento em clarividência, que o habilitou a fazer uma investigação científica dos fenômenos do Plano Astral. Em seu livro Como Mc Veio a Teosofia, descreve assim o seu treinamento:


Desenvolvimento Inesperado

Deve-se compreender que naquela época eu não possuía nenhuma faculdade clarividente, nem jamais me havia julgado ser um sensitiva. Lembro-me que era minha convicção que a homem devia nascer com alguns poderes psíquicos e um corpo sensitivo antes de poder tomar qualquer iniciativa nessa espécie de desenvolvimento. De sorte que nunca eu havia conjeturado que me fosse possível qualquer progresso desse tipo nesta encarnação, porém nutria a esperança de que se eu trabalhasse tão bem quanto soubesse nesta vida, eu poderia nascer na próxima com veículos mais adequados para essa linha particular de progresso.

No entanto, um dia, quando o Mestre Kuthumi me honrou com uma visita, Ele me perguntou se havia alguma vez tentado uma certa espécie de meditação relacionada com o desenvolvimento do misterioso poder chamado Kundalini. Eu tinha ouvido, certamente, falar desse poder, mas muito pouco sabia a seu respeito, e de qualquer modo o supunha absolutamente fora do alcance para os ocidentais. Todavia, Ele me recomendou fazer alguns esforços em determinadas diretrizes (que me comprometi a não divulgar a ninguém mais a não ser com Sua autorização direta) e me disse que Ele vigiaria esses esforços para ver que nenhum perigo resultasse.

Naturalmente aceitei a sugestão, e trabalhei firmemente, e, penso poder dizer, intensamente, nessa espécie particular de meditação diária. Tenho que admitir que foi um trabalho muito árduo e às vezes distintamente penoso, mas por certo perseverei, e no devido tempo comecei a obter os resultados que tinha sido levado a esperar. Certos canais tinham de ser abertos e certas divisões eliminadas; foi-me dito que quarenta dias era uma boa estimativa da média do tempo requerido, se o esforço fosse realmente enérgico e perseverante. Trabalhei nesse sentido durante quarenta e dois dias, e a mim me parecia estar à beira da vitória final, quando o próprio Mestre interveio e executou o ato final de rutura, que completou o processo e me capacitou daí em diante a usar a vista astral ao mesmo tempo que mantinha plena consciência na corpo físico. Isto eqüivale a dizer que a consciência astral e a memória se tornaram contínuas, quer o corpo físico permanecesse acordado ou adormecido. Foi-me explicado que com meus próprios esforços eu próprio teria conseguido a rutura vinte e quatro horas mais tarde, porém que o Mestre interferiu porque Ele desejava empregar-me imediatamente num certo trabalho.

Treinamento psíquico

Não obstante, não se deve supor nem por um momento que a obtenção deste poder particular fosse a finalidade do treinamento oculto. Ao contrário, apenas provou ser o início de um ano do mais árduo trabalho que jamais eu conhecera. Terá de se compreender que eu vivia ali na sala octogonal, junto à margem do rio, sozinho e durante longas horas diárias, e praticamente protegido de qualquer interrupção, exceto das horas de refeição que mencionei. Diversos Mestres foram bastante magnânimos para visitar-me durante esse período e oferecer-me várias sugestões; mas foi o Mestre Djwal Kul que me proporcionou a maioria das instruções necessárias. Possivelmente Ele foi movido a este ato tão amável por causa de minha estreita associação com ele em minha última existência, quando estudei sob sua orientação na escola pitagórica que ele fundou em Atenas, e mesmo tive a honra de dirigir depois de Sua morte. Não sei como agradecer-lhe tão grande soma de cuidados e incômodas que assumiu em minha educação psíquica. Paciente e repetidamente Ele criava uma vívida forma-pensamento, e me perguntava: "Que está vendo você?" E quando eu a descrevia com toda a minha melhor habilidade, vinha repetidamente o comentário:. "Não, não, você não está vendo certo; você não está vendo tudo; aprofunde-se mais, use a sua vista mental junto com a astral; force um pouco mais para adiante, um pouco mais alto."

Este processo tinha de ser amiúde repetido muitas vezes antes de meu mentor se dar por satisfeito. O discípulo tem de ser testado de todas as várias maneiras e sob todas as condições concebíveis; com efeito, pelo fim da instrução, espíritos da natureza brincalhões são especialmente chamados e ordenados de todas as passíveis maneiras para que se esforcem por confundir ou desnortear o vidente. Inquestionavelmente é um trabalho duro, e a tensão que ele impõe é, suponho, quase tão grande quanto a que um ser humano pode seguramente suportar; mas o resultado obtido é sem a menor dúvida mais do que compensador, pois leva diretamente à união do eu inferior com o Eu superior e produz uma imensa certeza de conhecimentos baseados na experiência que acontecimentos futuros jamais podem abalar

Na ocasião em que a conferência para a Loja de Londres estava sendo preparada, eu residia com o Sr. Leadbeater e freqüentava cursos para exames. Era hábito do Bispo Leadbeater (para dar-lhe o título que ele passou a usar depois de sua consagração como Bispo da Igreja Católica Liberal em 1916), nunca jogar fora os envelopes em que recebia cartas. Abria-os nos lados e utilizava suas faces internas para escrever memorandos. Este hábito ele o conservou até o último ano de sua vida. Depois de dar a conferência segundo as notas, em 21 de novembro de 1894, sua tarefa seguinte foi escrevê-la para publicação, intitulando-a Transaction N.° 24 da Loja de Londres. Começou a escrever um pouco por vez, em retalhos de papel que eram os envelopes abertos. Meu trabalho então consistia em fazer a transcrição dos farrapos de papel para um velho diário de estudantes, tamanho ofício. Por isso o manuscrito está feito em minha caligrafia. O trabalha de escrever levou de três a quatro semanas, pois ele se achava ocupado em vários tipos de atividades para a sua subsistência, e por isso só podia escrever em horas disponíveis.

Quando as provas do impressor dos Anais da Loja de Londres vieram ao Bispo Leadbeater, o manuscrita (que estava em minha caligrafia) foi por certo, devolvido pelo impressor. Este manuscrito mostrava as marcas do compositor e do revisor, ca brancura límpida das páginas desapareceu no processo do manuscrito. Isto não teria importância, pois uma vez impressoo manuscrita, este é atirado na cesta de papéis usados.

Mas eis que aconteceu um desusual e inesperado incidente, que evidentemente aturdiu a Bispo Leadbeater. Uma manhã ele me informou que o Mestre K. H. lhe havia pedido o manuscrito, pois desejava depositá-lo no Museu de Arquivos da Grande Fraternidade Branca. O Mestre explicou que O Plano Astral era uma produção fora do comum e um marco na história intelectual da humanidade. Alegou que até então, mesmo numa civilização tão grande como a dos Atlantes, os sábios das escolas ocultas não haviam abordado os fatos da Natureza segundo o moderno ponto de vista científico, porém de um ângulo diferente. Os instrutores ocultos do passado haviam procurado mais o significado interno dos fatos, o que se poderia chamar o "lado vida" da Natureza, e menos o "lado forma" da Natureza, tal como se caracteriza o método científico da atualidade. Conquanto até então os Adeptos houvessem reunido um vasto cabedal de conhecimentos provindos de civilizações passadas, concernentes aos mistérios da Natureza, tais conhecimentos haviam sido sintetizados não segunda uma detalhada análise científica, mas mediante reações da consciência ao "aspecto vida". Por outro lado, pela primeira vez entre os ocultistas, havia sido feita uma pormenorizada investigação do Plano Astral em conjunto, de maneira similar à que numa selva amazônica teria feito um botânico a fim de classificar suas árvores, plantas e arbustos para escrever uma história botânica.

Por esta razão o livrinho O Plano Astral foi definitivamente um marco, e o Mestre, como guarda dos Arquivos, desejou colocar no Grande Museu o escrito desse plano. Este Museu contém uma cuidadosa seleção de vários objetos de importância histórica para os Mestres e seus discípulos, em conexão com seus estudos superiores, e é especialmente um registro do progresso da humanidade em vários campos de atividade. O Museu contém, por exemplo, globos modelados para mostrar a configuração da Terra em várias épocas. Foi destes globos que o Bispo Leadbeater traçou os mapas que foram publicados em outra transação da Loja de Londres, o do livro Atlantis de W. Scott-Elliot. Entre outros objetos significativos o Museu contém uma peça de Mercúrio sólido, que é um isótopo. Conserva vários textos antigos relativos a religiões extintas e atuais, bem como outros, materiais úteis para uma compreensão da obra da "Vaga de Vida" neste globo, a nossa Terra.

A única ocasião que possa recordar-me em que se poderia descrever o Bispo Leadbeater como "excitado" foi quando recebeu do Mestre este pedido de seu livrinho, pois o manuscrito estava manchado — melhor se poderia descrevê-lo "sujo" — depois do manuseio do impressor. Não obstante, o pedido do Mestre tinha de ser atendido. Surgiu então a questão de como transportar o manuscrito para o Tibete. Todavia, isto não o apoquentou, pois o Bispo Leadbeater possuía certos poderes ocultos que não revelou a outros, embora eu os tenha observado em diversas ocasiões.

O manuscrito teve de ser transportado por desmaterialização, e ser rematerializado no Tibete.

Aconteceu ter eu uma fita de seda amarela de três polegadas de largura, e dobrando o manuscrito em quatro, enrolei-o com a fita, que estiquei para formar uma faixa. Eu me achava excitado, pois havia ali uma notável oportunidade para conseguir prova de um "fenômeno". Se o manuscrito fosse fechado numa caixa e a chave estivesse em meu poder todo o tempo, e depois se verificasse haver desaparecido o manuscrito, eu teria uma prova esplêndida para narrar.

Mas por estranho que pareça, entre os pertences do Bispo Leadbeater e meus daquela época não tínhamos nada propriamente com fecho. Havia uma velha canastra coberta de couro, mas sua fechadura estava quebrada. Tínhamos ainda muitas maletas, mas todas com fechaduras defeituosas, e não havia absolutamente nada com fechadura aproveitável. Existia uma pequena caixa de madeira com uma carapaça de tartaruga embutida, que era uma caixa de trabalhos de sua mãe, mas sua chave se havia perdido há muito tempo.

Nada restava a fazer senão colocar o manuscrito dentro desta caixa e empilhar sobre ela um monte de livros, na falta de coisa melhor. Na manhã seguinte, ao acordar, removendo a pilha de livros e olhando dentro da caixa de trabalhos, o manuscrito não estava mais ali. Meu pesar por perder a oportunidade de demonstrar um fenômeno não se sentiu consolado por me dizerem que eu próprio havia levado astralmente o manuscrito ao Mestre.

Talvez seja interessante transcrever aqui o que escrevi algures deste tema e da impossibilidade de encontrar um exemplo da ação de faculdades superfísicas que a céptica mentalidade cientifica pudesse considerar insofismável:

"Sempre que poderíamos ter dado um exemplo de prova, com referência a fatos ocultos, sem qualquer possível objeção, sempre algo acontecia para frustrar a finalidade da prova. É bem sabido que, nas primórdios do Espiritismo, muitos objetos raros foram transportados de pontos distantes, demonstrando que os espíritos podiam empregar poderes extraordinários. Mas em cada exemplo faltava um elo final na cadeia. De maneira semelhante, nos fenômenos produzidos pêlos Adeptos em conexão com o trabalho de Madame Blavatsky em Simla, teria sido para Eles coisa facílima transportar de Londres para Simla o Times da dia, como certa vez foi sugerido. Mas em todos os casos de fenômenos havia a omissão, por inadvertência ou outra razão qualquer, de algum importante fato comprobatório".

Quando indagamos do Mestre sobre este assunto, fomos informados que Eles propositalmente evitaram qualquer fenômeno que pudesse ser absolutamente "comprovado" em matéria de prava. Era Seu plano que, enquanto a humanidade estivesse no presente estágio, em que a um grande número de mentalidades poderosas falta um adequado desenvolvimento moral, nenhuma oportunidade se dará a estas inteligências inescrupulosas para terem uma confiança completa na existência de poderes ocultos. Enquanto houver cepticismo nesta matéria, a humanidade estará protegida de ser explorada por inescrupulosos. Já sabemos quanto a humanidade tem sido explorada econômica e industrialmente pelas mentalidades egoístas que controlam os recursos da natureza. Quão grande calamidade ocorreria se essas mesmas mentalidades pudessem também utilizar poderes ocultos para a exploração, não é difícil de conceber, mesmo a alguém dotado de pequena imaginação.

O Bispo Leadbeater encontrou a Dr.ª Annie Besant pela primeira vez em 1894. No ano seguinte ela o convidou e a mim para residirmos na Sede Central Teosófica de Londres, 19 Avenue Road, Parque dos Regentes, onde H.P.B. faleceu em 1891. Esta casa era sua, e daí o seu convite a nós. Deste período em diante começou uma muito estreita colaboração entre a Dr.ª Besant e a Bispo Leadbeater, a qual continuou ininterrupta até o fim de suas vidas. Em 1892 ela iniciou uma série chamada "Manuais Teosóficos", consistindo de pequenos livros sumariando ensinamentos teosóficos sobre vários assuntos. Os quatro primeiros, respectivamente, Sete Princípios do Homem, Reencarnação, Karma, Morte, Depois? haviam sido editados quando ela solicitou permissão do Bispo Leadbeater para publicar a Transação da Loja de Londres como um manual da série, o qual apareceu oportunamente como o Manual n.º 5.

Foi em 1895 que ambos fizeram em conjunto investigações sobre a estrutura do Hidrogênio, Oxigênio e Nitrogênio (e um quarto elemento batizado por nós "Occultum", ainda não descoberto). ‘Nesse mesmo ano ambos fizeram extensas investigações da estrutura, condições e habitantes dos Planos Mentais inferior e superior. Tomando por modelo a obra feita pelo Bispo Leadbeater quando investigou o Plana Astral, a Dr.ª Besant e ele examinaram exemplos e mais exemplos de egos em "Devachan", naquele período de sua existência depois da morte no estado de felicidade chamado o Mundo Celeste. Como antes, foi o Bispo Leadbeater quem escreveu as investigações, pois a Dr.ª Besant tinha muitas ocupações; esta foi a origem do Manual Teosófico n.° 6, The Devachanic Plane.

Estas duas obras,O Plano Astral e O Plano Devacânicofow Mental), reúnem uma investigação, de maneira tão objetiva e científica quanto a Dr.’ Besant e o Bispo Leadbeater puderam fazer, e o resultado é uma soma muito preciosa de fatos concernentes ao mundo invisível. Uma acurada análise e estudo destes fatos por qualquer estudante ardoroso, datado de uma mente imparcial e sem preconceitos, não podem deixar de lhe proporcionar o sentimento de que, embora possa ser incapaz de crer nas exposições feitas, há, no entanto, uma característica acerca deles. Ë que parecem ser descrições de objetos e acontecimentos vistos objetivamente, como que por meio dê um microscópio ou telescópio, e não subjetivamente, coma é o caso de um novelista contando os incidentes de uma vívida estória.

Esta é, em resumo, a história da escrita deste pequeno mas precioso manual: O Plano Astral.

Um Exame Geral

Todos nós, embora na maior parte não tenhamos dado por isso, vivemos no seio de um vasto, invisível e populoso mundo. Quando dormimos ou quando no estado de êxtase, os nossos sentidos físicos entram momentaneamente num estado de inação. podemos até certo ponto ter a consciência desse mundo e muitas vezes acontece trazermos, ao despertar, recordações mais ou menos vagas, do que lá vimos e ouvimos. Quando, por ocasião dessa transição a que vulgarmente chamamos morte, o homem se despoja totalmente do corpo físico, é nesse mundo invisível que ele ingressa e lá fica vivendo durante os longos séculos que medeiam entre as suas encarnações nesta existência terrestre. A maior parte destes longos períodos, a sua quase totalidade mesmo, é passada no mundo-céu, ou Devachan. O presente trabalho é dedicado à parte inferior desse mundo invisível, ao estado em que o homem ingressa imediatamente após a morte — o Hades ou mundo inferior dos gregos, o purgatório ou etapa intermédia dos cristãos, e que os alquimistas da Idade Média chamavam "plano astral".

O objeto deste manual é colher e tornar compreensíveis todos os elementos referentes a essa interessantíssima região, elementos que se acham disseminados um pouco arbitrariamente por toda a literatura teosófica, e ao mesmo tempo juntar-lhes casos novos, recentemente chegados ao nosso conhecimento. Quanto a estes, visto que são apenas resultados da investigação de alguns estudiosos, é claro que os apresentamos como tais, sem que exijamos que os considerem como afirmações categóricas e da maior autoridade.

Todavia, tomamos todas as precauções em nosso poder para garantir a sua exatidão, para o que houve o cuidado de apenas se admitirem neste manual os fatos observados e comprovados por, ao menos, dois de nossos observadores mais peritos e treinados, e além disso confirmados por investigadores mais antigos, de experiência evidentemente maior do que a nossa. Nestas condições, é de se esperar que a presente descrição do plano astral, embora necessariamente incompleta, possa, dentro dos limites que lhe impusemos, inspirar absoluta confiança aos nossos leitores. A primeira idéia a fixar nessa descrição é a absoluta realidade do plano astral. O plano astral existe. Mas, é claro, quando falo de realidade, não parto do ponto de vista metafísico que diz nada haver de real, porque tudo é transitório, a não ser o Absoluto não manifestado. A palavra é empregada no seu sentido vulgar, de todos os dias, e quer significar que os objetos e habitantes do mundo astral são reais, precisamente como os nossos corpos, a nossa mobília, casas e monumentos — tão reais como qualquer lugar que estamos habituados a ver e a freqüentar diariamente: Charing Cross, por exemplo, para nos servirmos da expressiva comparação de uma das obras teosóficas mais antigas. Tudo o que existe nesse plano não dura, naturalmente, mais do que os objetos do plano físico, mas, precisamente como estes, não deixa de ser uma realidade cuja existência não temos o direito de ignorar, simplesmente pelo fato de a grande maioria da humanidade não ter por enquanto consciência dela, ou, quando muito, apenas a pressentir vagamente.

Ninguém pode ter uma compreensão nítida das doutrinas da Religião-Sabedoria, se não souber e não compreender conscientemente que no nosso sistema solar existem planos perfeitamente definidos, cada um formado pela sua matéria de diferentes graus de densidade, e que alguns desses planos estão abertos à visita e à observação dos que conseguiram obter os requisitos necessários para isso, exatamente como qualquer país estrangeiro está ao alcance do turista. E ainda que, da observação comparada dos que trabalham nesses planos, se podem inferir provas suficientes da sua existência e da sua natureza,provas em nada menos concludentes do que as subsistentes para provar a existência da Groenlândia ou Spitzberg. E assim como qualquer um pode, se quiser dar-se a esse trabalho e tiver para isso os meios necessários, conhecer pessoalmente a Groenlândia ou Spitzberg, assim também qualquer investigador, se quiser dar-se ao trabalho de adquirir, levando uma certa vida, os requisitos necessários, pode conhecer pessoalmente os planos superiores em questão.

Estes se chamam, por ordem decrescente de densidade da matéria que os forma, respectivamente, físico, astral, mental ou devachânico, búdhico e nirvânico. Acima destes há ainda dois, mas tão além das nossas atuais faculdades de percepção que, por enquanto, não nos ocuparemos deles. A matéria que forma estes planos é absolutamente a mesma; a sua densidade em cada um deles é que difere: é como se houvesse um formado de água-gêlo, outro de água-líquido, outro de água-vapor, etc., e realmente os estados de matéria a que chamamos sólido, líquido e gasoso, não são mais do que as três subdivisões inferiores da matéria pertencentes ao plano físico. É matéria ainda mais rarefeita a que forma os outros, mas, na essência, é a mesma matéria.

A região astral, que vou tentar descrever, forma o segundo destes grandes planos da natureza — o imediatamente superior (ou interior) a este mundo físico, tão conhecido de nós todos, e onde vivemos. Tem-se lhe chamado "o reino da ilusão", não porque em si seja mais ilusório do que o mundo físico, mas porque as impressões que dele trazem os observadores pouco treinados são extremamente vagas e impalpáveis, oferecendo, portanto, pouco crédito, fato devido a duas causas principais: em primeiro lugar, os seus habitantes têm o poder maravilhoso de mudar constantemente de forma com uma enorme rapidez, e de exercer, por assim dizer, uma espécie de magia ocasional sobre aqueles à custa de quem se querem divertir;e em segundo lugar, a faculdade de ver nesse plano é muito diferente da faculdade visual que nos é dada no plano físico. É, além disso, extraordinariamente mais desenvolvida, pois, um objeto é, por assim dizer, visto por todos os lados ao mesmo tempo. Olhando para um sólido com a vista astral, o olhar abrange não só o exterior mas o interior do corpo; compreende-se, portanto, que seja extremamente difícil para um observador com pouca prática ter compreensão nítida do que vê, extrair da imagem confusa, que pela primeira vez se lhe apresenta à vista, a noção verdadeira do seu significado, e, acima de tudo, é-lhe quase impossível traduzir o que realmente vê, servindo-se da pobre linguagem de que usa diariamente.

Um bom exemplo do gênero de erro que se comete com freqüência é a troca dos algarismos de um número visto à luz astral: 139 em vez de 931, por exemplo. É claro que um estudante de ocultismo, dirigido por um Mestre capaz, não cometerá nunca um erro tão grosseiro, a não ser por uma questão de precipitação ou falta de cuidado, visto que os discípulos seguem um curso regular onde aprendem a ver com precisão na luz astral. O Mestre, por vezes um discípulo já mais adiantado, tem o cuidado de apresentar constantemente todas as formas de ilusão possíveis, acompanhadas da pergunta — o que é isto? —, corrigindo todos os erros nas respostas, explicando as razões dos enganos, até que o neófito adquire gradualmente uma certa confiança em si mesmo e passa a haver-se corretamente com os fenômenos do plano astral, com uma certeza infinitamente superior à que é possível ter-se na vida física.

Mas não se trata só de aprender a ver corretamente; é necessário também aprender a transladar o que vê, de um plano para outro. Para isso, treina-se cuidadosamente em transportar a sua consciência do plano físico para o astral ou mental, e vice-versa, para evitar que, antes da aquisição desta faculdade as suas reminiscências se percam ou se adulterem no hiato que separa a fixação de sua consciência nos vários planos. Adquirido este poder de deslocamento e fixação da consciência, o discípulo pode servir-se de todas as faculdades astrais, não só quando mergulhado no sono, ou em êxtase, mas ainda quando se ache perfeitamente acordado e no meio da sua vida física normal.

Há, entre os teosofistas, quem tenha falado com certo desprezo do plano astral, considerando-o menos digno de atenção; mas, a meu ver, laboram em erro. É evidente que o que aspiramos é a vida do espírito, e que seria um verdadeiro desastre ficarmos satisfeitos com a obtenção da consciência astral, desistindo de um desenvolvimento mais elevado. Há, é certo, quem tenha um Karma tal que, por assim dizer, é dispensado do plano astral, podendo logo de princípio começar pelo desenvolvimento das faculdades mentais mais elevadas. Mas não é esse o processo geralmente seguido pêlos Mestres da Sabedoria com os discípulos.

Sempre que é possível, este processo evidentemente é empregado, porque poupa trabalho e tempo, mas, em geral, o progresso aos saltos é-nos interdito pelas nossas faltas ou loucuras passadas. Devemos, portanto, contentar-nos em abrir o nosso caminho passo a passo, lentamente, e visto que é esse plano astral o imediatamente a seguir ao nosso mundo de matéria mais densa, é nele que devemos começar as nossas primeiras experiências superfísicas. E visto isto, é do maior interesse o seu conhecimento para os que começam estes estudos, tanto mais que e da maior importância, uma compreensão clara dos mistérios astrais, não só para se ter uma idéia racional acerca de muitos dos fenômenos das sessões espíritas, das casas em que aparecem as chamadas almas do outro mundo, etc., que de outro modo seriam inexplicáveis, mas também para que com conhecimento de causa nos possamos, precaver contra certos perigos possíveis.

A primeira introdução consciente nesta região notável vem aos homens por várias maneiras. Alguns sentiram na sua vida, uma vez unicamente, uma influência qualquer, vaga e invulgar, que lhes comunicou o grau de sensibilidade suficiente para reconhecerem a presença de um dos seus habitantes; mas como a experiência não se repetiu, vem um dia em que se convencem que foram apenas vítimas de uma alucinação. Outros têm a impressão de que em certos momentos, cada vez mais freqüentes, podem ver e ouvir coisas para as quais os que os cercam são cegos e surdos, e outros ainda — é talvez este o caso mais vulgar — começam a recordar-se, com uma nitidez sucessivamente maior, do que viram e ouviram nesse plano, durante o sono. A visão astral pode obter-se por vários processos, e entre eles, o muito conhecido de fixar longamente um cristal.

É este um dos processos seguidos por muitos que se dedicam isoladamente a estes estudos. Mas os que possuem a inigualável vantagem da direção de um Mestre experimentado, são geralmente transportados a esse plano pela primeira vez, graças à Sua proteção especial que se manifestará até que um certo número de provas convençam o Mestre de que o discípulo está em condições de seguir desacompanhado, isto é, está à prova dos perigos ou terrores que com toda a probabilidade encontrará no seu caminho. Mas seja como for, não resta a menor dúvida de que o primeiro momento em que um homem adquire a consciência, clara e indubitável, de que vive no meio de um vasto mundo repleto de vida exuberante, que a maior parte dos seus semelhantes não pressente, deve marcar na sua existência uma época memorável e de grande influência do seu futuro.

Tão exuberante e tão variada é esta vida do plano astral, que a princípio o neófito se sente perante ela absolutamente estupefato, não sabendo por onde começar o seu estudo. E mesmo para o investigador com maior prática, é extremamente difícil o trabalho da sua classificação e catalogação. Se a um explorador de qualquer região tropical desconhecida fosse exigida, não só uma descrição completa da região explorada, com todos os detalhes rigorosos acerca de suas produções minerais e vegetais, mas ainda por cima se lhe exigisse um tratado dos gêneros e espécies de cada uma das miríades de insetos, aves, mamíferos e répteis característicos da região, ele decerto recuaria apavorado perante a magnitude de tal empresa. Pois bem: esse trabalho seria apenas um pálido reflexo dos embaraços que esperam o investigador psíquico, porque a natureza dos assuntos a estudar é muitíssimo mais complicada, primeiramente pela dificuldade de transportar com exatidão do plano astral para o nosso a memória do que viu, e em segundo lugar, pela impropriedade da linguagem vulgar para a expressão do que se tem de relatar.

Todavia, assim como o explorador no plano físico começaria provavelmente a descrição de uma região por uma espécie de descrição geral do cenário e respectivas características, também nós, ao empreendermos tornar conhecido o plano astral, começaremos este ligeiro esboço por tentar dar uma idéia do cenário que forma o fundo das suas atividades maravilhosas e sempre diferentes. Mas, logo no começo surge-nos uma dificuldade quase insuperável, derivada da extrema complexidade do assunto. Todos aqueles que admiram o poder de ver claramente no plano astral, são unânimes em reconhecer que a tentativa de evocação de uma pintura cheia de vida desse cenário perante olhos inexperientes, eqüivale a querer fazer admirar a um cego, por uma simplesescrição oral, a requintada variedade dos matizes de um pôr de sol; — por mais expressiva, mais detalhada e mais fiel que seja a descrição, nunca se pode obter a certeza de que no espírito do cego se represente com clareza a verdade.

(Livro de C. W. Leadbeater - Continua)

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